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quinta-feira, 15 de setembro de 2011

[CRÍTICA] De Repente, No Último Verão


15-09-2011-suddenly-last-summer


Título original: Suddenly, Last Summer
Direção: Joseph L. Mankiewicz
Roteiro: Gore Vidal e Tennessee Williams
Elenco: Elizabeth Taylor (Catherine Holly), Katharine Hepburn (Sra. Violet Venable), Montgomery Clift (Dr. Cukrowicz), Albert Dekker (Dr. Lawrence J. Hockstader), Mercedes McCambridge (Sra. Grace Holly), Gary Raymond (George Holly)
Ano: 1959
Duração: 114 min.




“As vidas de muitas pessoas nada mais são do que trilhas de detritos - a cada dia mais e mais detritos... longas trilhas de detritos, com nada para limpá-los além da morte.” - Sra. Venable


De Repente, No Último Verão trata da misteriosa morte de Sebastian Venable, um poeta, filho da aristocrata Violet Venable (Katharine Hepburn), que contrata o Dr. John Cukrowicz (Montgomery Clift), cirurgião, para realizar uma lobotomia em sua sobrinha, Catherine (Elizabeth Taylor), última pessoa que viu seu filho vivo, considerada insana por insistir num relato absurdo sobre os últimos dias de vida do rapaz, e insinuar que há uma verdade ainda mais terrível sobre a morte de Sebastian do que a Sra. Venable é capaz de admitir.

segunda-feira, 5 de setembro de 2011

[CRÍTICA] Zodíaco

05-09-2011-zodiac


Título original: Zodiac
Diretor: David Fincher:
Roteiro: James Vanderbilt
Elenco: Jake Gyllenhaal (Robert Graysmith), Mark Ruffalo (Inspetor David Toschi), Anthony Edwards (Inspetor William Armstrong), Robert Downey Jr. (Paul Avery), Brian Cox (Melvin Belli), John Carroll Lynch (Arthur Leigh Allen), Chlöe Sevigny (Melanie), Elias Koteas (Sgt. Jack Mulanax), Donal Logue (Capitão Ken Narlow)
Ano: 2007
Duração: 162 min.


Diretor mais conhecido por seu virtuosismo técnico, especialmente no manejo das câmeras, que sempre se arriscam em malabarismos ousados, David Fincher iniciou com Zodíaco uma fase mais sóbria de sua carreira, assim como seu projeto mais ambicioso.

sexta-feira, 19 de agosto de 2011

[CRÍTICA] Super 8


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Diretor: J. J. Abrams
Roteiro: J. J. Abrams
Elenco: Joel Courtney (Joe Lamb), Elle Fanning (Alice Dainard), Riley Griffiths (Charles), Ryan Lee (IX) (Cary), Gabriel Basso (Martin), Kyle Chandler (Jackson Lamb), Ron Eldard (Louis Dainard), Amanda Michalka (Jen Kaznyk), Zach Mills (Preston), Beau Knapp (Breen), Noah Emmerich (Nelec), Joel McKinnon Miller (Mr. Kaznyk), Jessica Tuck (Mrs. Kaznyk), Jade Griffiths (Benji Kaznyk), Britt Flatmo (Peg Kaznyk), Glynn Turman (Dr. Woodward), Richard T. Jones (Overmyer), Amanda Foreman (Lydia Connors - Ch 14 News Anchor), David Gallagher (Donny), Brett Rice (Sheriff Pruitt), Bruce Greenwood (Cooper), Dale Dickey (Edie), Jack Axelrod (Mr. Blakely), Dan Castellaneta (Izzy)
Ano: 2011
Duração: 112 min.

Super 8, segundo o próprio J. J. Abrams definiu numa entrevista, é como aquelas brincadeiras que fazemos quando criança, em que imaginamos nossa cidade sendo invadida por alienígenas ou zumbis, e tudo acaba sendo uma desculpa pra impressionarmos a menina por quem somos apaixonados com algum ato heróico. Não é à toa que a idade dos garotos bate com a que Abrams tinha na época em que a história se passa (1979). Joe (Joel Courtney) é a versão alternativa de Abrams num passado que jamais existiu, mas que ele desejou muito que tivesse acontecido.

quinta-feira, 11 de agosto de 2011

[CRÍTICA] Disque M Para Matar

Direção: Alfred Hitchcock
Roteiro: Frederick Knott
Elenco: Ray Milland (Tony Wendice), Grace Kelly (Margot Mary Wendice), Robert Cummings (Mark Halliday), John Williams (Inspetor Chefe Hubbard)
Duração: 105 min.
Ano:
1954


Em Disque M para Matar, Hitchcock exibe seu domínio pleno do cenário, dos objetos cênicos, e da dinâmica interna dos atores, num trabalho mais racional do que esteticamente belo e rico em simbolismos (embora eles existam). O diretor pouco interfere na narrativa, fugindo sabiamente de estilismos que chamem muita atenção para si, consciente da importância dos detalhes presentes na história, os quais têm papel fundamental em seu desenrolar.


sábado, 6 de agosto de 2011

[CRÍTICA] Psicose

Direção: Alfred Hitchcock
Roteiro: Joseph Stefano
Elenco: Janet Leigh (Marion Crane), Anthony Perkins (Norman Bates), Vera Miles (Lila Crane) e John Gavin (Sam Loomis)
Duração: 109 min.
Ano:
1960

Psicose é outro daqueles grandes clássicos do cinema que intimida qualquer pessoa que o respeita como tal, e ainda assim deseja escrever uma opinião mais crítica a seu respeito.

Hithcock já não precisava provar mais nada na época que o dirigiu, tendo produzido alguns dos melhores suspenses já realizados, mas o fez, e novamente inovou com uma história conduzida com sua genialidade habitual.

Pequenos detalhes, como as cenas em que Marion imagina supostas conversas entre seus conhecidos em reação ao seu desaparecimento, que servem tanto para ilustrar seu estado psicológico, como para preencher lacunas da história. Ou a fixação de Norman Bates por pássaros, sugerindo seu desejo oculto por libertar-se de sua condição (além de ser um easter-egg não-intencional para o filme seguinte de Hitchcock). Todo esse cuidado no desenvolvimento dos personagens e na composição dos cenários é o que diferencia um bom diretor de um prodígio.

E não é a toa que o diretor nutria tanto respeito por Anthony Perkins durante as filmagens. Seu trabalho em Psicose é excepcional. Simpático e bom moço no início, Norman Bates não desperta suspeitas, até que o ator começa oferecer insights sobre os recessos mais ocultos da personalidade de Bates, durante seu jantar com Marion em sua sala reservada, cercado por pássaros empalhados. Não é a toa que o roteiro se permite uma das viradas mais ousadas já realizadas num suspense, para dar mais espaço ao seu desenvolvimento e nos permitir investigar mais a fundo este personagem tão fascinante.

A famosa cena do banho, por mais que você tenha visto inúmeras vezes antes de assistir o filme em si, continua impactante até hoje. Tensa, fragmentada, cheia de cortes precisos que fazem uma perfeita rima visual ao que ela própria exibe ao espectador, serve tanto para pontuar os golpes desferidos pelo criminoso, como o estado de surpresa, confusão e pânico da vítima, que em seus últimos segundos de vida, paralelamente à sua luta para sobreviver ao ataque, parece travar também uma luta interna, numa última tentativa de juntar as peças que a levaram àquele momento, na esperança de entender porque aquilo estava acontecendo com ela. Estaria sendo punida pelo crime que ela própria cometeu, e pelo qual vinha sentindo-se culpada desde o primeiro instante em que decidiu cometê-lo? É arrependimento o que vemos em seu olhar derradeiro?

Com um roteiro excelente, capaz tanto de instigar o espectador a desvendar seu mistério, como ainda promover um brilhante estudo de personagem, e um Hitchcock com total confiança em sua capacidade de potencializar o mistério da trama, Psicose ainda conta com uma das trilhas sonoras mais brilhantes e icônicas do cinema, composta por Bernard Herrmann, outro gênio.

Obrigatório para qualquer cinéfilo que se preze.

sexta-feira, 5 de agosto de 2011

[CRÍTICA] The Troll Hunter

Direção: André Øvredal
Roteiro: André Øvredal e Håvard S. Johansen
Elenco: Otto Jespersen (Hans, o caçador de troll), Glenn Erland Tosterud (Thomas), Johanna Mørck (
Johanna), Tomas Alf Larsen (Kalle), Urmila Berg-Domaas (Malica)
Duração: 90 min.
Ano: 2010


O filme se sai relativamente bem na tentativa de criar um documentário falso. Neste ponto chega a ser melhor que A Bruxa de Blair, por exemplo. Em algumas cenas faz lembrar um Globo Repórter, com a câmera dentro do carro, filmando as estradas pelas quais passam, enquanto Hans (Otto Jespersen) desfia todo seu conhecimento a respeito das criaturas que caça.

Além do atrativo de proporcionar ao espectador o contato com uma cultura tão rica e curiosa como a norueguesa, o diretor André Ovredal ainda nos brinda com belas imagens das paisagens bucólicas e rupestres da região, enquanto ao roteiro cabe a tarefa de desmistificar os trolls, por meio de uma pseudo-ciência que encontra formas criativas de explicar os estranhos poderes e peculiaridades das fabulosas criaturas.

Otto Jespersen é muito convincente no papel do caçador de trolls. Sua postura arisca no início, e a forma como vai se abrindo aos poucos para os repórteres, revelando cada vez mais informações sobre seu trabalho, e sobre as criaturas que mata, como forma de se justificar, além da seriedade com que revela curiosidades sobre os trolls, faz com que acreditemos que aquele homem já se encontra tão acostumado e calejado por seu trabalho que, todo o encantamento se perdeu.

Infelizmente o filme tem alguns problemas de coerência. A montagem é muito fragmentada e truncada. Por um lado isto condiz com a idéia de a "trama" ser composta de uma série de trechos montados a partir de um suposto material mais extenso, conforme é explicado no texto que introduz a história, mas isto acaba atrapalhando o ritmo, que torna-se arrastado em diversos momentos, e apresenta cenas irrelevantes para o desenvolvimento da trama.

Outro problema surge quando um dos personagens morre, e os demais mal esboçam uma reação, para logo em seguida praticamente ignorarem o fato e seguirem em frente como se aquele incidente não houvesse ocorrido.

E algumas questões importantes ficam sem resposta: por que Hans é o único responsável pelo controle das criaturas? Não seria mais prudente treinar outras pessoas para abrangerem uma área maior? E como conseguem esconder a existência de um bicho de 100 metro de altura?

Ainda que tenha suas falhas, o filme diverte, fazendo uso de um formato já existente para abordar um elemento da mitologia local, e atualizá-lo para um mundo extremamente racional como é o nosso.

terça-feira, 2 de agosto de 2011

[CRÍTICA] Intriga Internacional

Direção: Alfred Hitchcock
Roteiro: Ernest Lehman
Elenco: Cary Grant (Roger O. Thornhill), Eva Marie Sant (Eve Kendall),
James Mason (Phillip Vandamm) e Martin Landall (Leonard).
Duração: 131 min.
Ano: 1959

O que torna Intriga Internacional um filme tão agradável de assistir, em primeiro lugar, é o trabalho de Cary Grant. Seu personagem é o velho conhecido sujeito comum envolvido numa situação extraordinária, mas graças ao trabalho do ator, que faz de Roger Tornhill um cara esperto e bem articulado, não demora muito para confiarmos em sua capacidade de livrar-se de qualquer enrascada, por mais complicada que ela nos pareça.

Todo o suspense e imprevisibilidade do filme não reside no fato de não sabermos se o mocinho terminará a trama vivo ou morto, mas sim em como, e se, ele chegará ao cerne do jogo kafkiano para o qual foi arrastado no início da história. Visto que estamos falando de mais uma obra do mestre do gênero, pode apostar que tudo irá se enroscar mais ainda antes de descobrirmos o que diabos está acontecendo com Roger.

Eu adoro como Hitchcock não perde tempo e parte logo para a premissa. Vemos uma rápida conversa entre Roger e sua secretária; ele entra num carro; chega num hotel onde vai se encontrar com alguns empresários; conversa um pouco com eles; sai um minuto pra enviar um telegrama; e no caminho é sequestrado pelos capangas do vilão da história. Tudo isto muito bem resolvido nos 6 primeiros minutos. Não tem como não gostar de uma introdução como esta!

Daí pra frente, exceto por uma retomada de fôlego no meio da história, quando ela é parcialmente interrompida para apresentar o interesse romântico do protagonista, a correria não pára mais.

Até aqui é o filme mais movimentado de Hitchcock que assisti, não exatamente por suas cenas de ação, mas pelo ritmo da história mesmo. Roger sai de um aparente beco sem saída para dar de cara com outro, e assim prossegue até o fim.

Impossível não comentar sobre a icônica sequência do avião. Ela inteira é excepcional, mas chamou-me a atenção especialmente todo o trabalho de direção e montagem feito antes de começar a perseguição em si. O momento em que Roger chega na encruzilhada deserta; sua longa espera, sobressaltando-se sempre que um veículo se aproxima, na expectativa de que "desta vez" será George Kaplan; e o detalhe do avião passando lá no fundo muito antes de ganhar destaque. Genial.

E como se apenas uma cena memorável não fosse o bastante, Hitchcock ainda nos presenteia com o clímax no Monte Rushmore, que é outro daqueles momentos que transformam um filme em algo maior que a vida, assim como foi grande parte de sua obra.

Intriga Internacional é mais um trabalho de direção excepcional, um verdadeiro banquete para amantes do cinema em busca daquelas iguarias raras, que ficam mais deliciosas a cada nova mordiscada.

segunda-feira, 1 de agosto de 2011

[CRÍTICA] Janela Indiscreta

Direção: Alfred Hitchcock
Roteiro: John Michael Hayes
Elenco: James Stewart (L. B. 'Jeff' Jeffries), Grace Kelly (Lisa Carol Fremont), Wendell Corey (Detetive Thomas J. Doyle) e Thelma Ritter (Stella).
Duração: 112 min.
Ano: 1954


Hitchcock é um verdadeiro maestro regendo uma orquestra de vidas, sem que perca o controle sobre nenhuma delas, nesta que é uma de suas maiores realizações.

Vale a pena pesquisar um pouco sobre a história por trás da produção. O filme foi inteiro filmado em um só set, que reproduz com perfeição uma vizinhança inteira. Muitos dos apartamentos vistos no filme são totalmente funcionais, com água e luz próprias. Além disto, a maior parte da história foi filmada do apartamento de Jeffries, com Hitchcock comandando os atores que interpretam seus vizinhos através de fones de ouvido pintados com a cor da pele.

Um dos maiores acertos de Hitchcock é justamente a decisão de ficar ao lado de Jeffries durante quase toda a história, conferindo a ela uma verossimilhança poucas vezes atingida. Outro acerto é o excepcional design de som, que explora ao máximo os sons diegéticos, transformando todo o filme numa experiência imersiva que não perdeu nem um pouco do impacto sobre o expectador quase seis décadas depois.

Mas é na condução das subtramas que se desenrolam diante da janela de Jeffries que Hitchcock, novamente, faz por merecer o título de mestre. O próprio conceito de janelas como forma de navegar pelas inúmeras subtramas, além de brilhante, é uma das prováveis fontes de inspiração dos primeiros programadores que imaginaram uma interface gráfica baseada neste elemento tão comum ao nosso cotidiano que, anos depois, daria origem ao sistema operacional Windows. E Hitchcock demonstra controle pleno ao fluir de um para outro plot, e entrelaçá-los, conduzindo com enorme inteligência as ressonâncias de um sobre o outro, num caos ordenado de fazer qualquer cinéfilo ficar de olhos marejados com tamanho virtuosismo.

Contando um elenco muito bem afinado, talvez os maiores destaques, além de, obviamente, James Stewart e Grace Kelly, sejam Thelma Ritter, cuja enfermeira Stella ganha alguns dos melhores e mais divertidos diálogos; e a Srta. Coração Solitário, interpretada com sensibilidade por Judith Evelyn, que consegue comover, mesmo aparecendo tão pouco, além de protagonizar um dos momentos mais belos e poéticos do filme, no qual o destino de sua personagem é afetado por um de seus vizinhos.

Apesar de um pequeno deslize no tumultuado clímax, em que duas cenas têm a velocidade artificialmente acelerada, denunciando uma pequena falha de Hitchcock na pós-produção, este em nada compromete o resultado final, que facilmente figura entre uma das muitas obras-primas do diretor.

Janela Indiscreta é uma das mais engenhosas produções da história do cinema, mais do que obrigatória para qualquer cinéfilo que se preze. Nunca é tarde para assistir essa preciosidade cinematográfica.

sábado, 30 de julho de 2011

[CRÍTICA] Um Corpo Que Cai

Direção: Alfred Hitchcock
Roteiro: Alec Coppel e Samuel A. Taylor
Elenco: James Stewart (John "Scotie" Ferguson), Kim Novak (Madeleine Elster / Judy Barton), Tom Helmore (Gavin Elster)
Duração: 128 min.
Ano: 1958


Um Corpo Que Cai é daqueles filmes que provam que determinadas obras só podem ser plenamente apreciadas quando se tem um senso crítico mais apurado. Pelo menos este foi o meu caso. Assisti o filme há alguns anos atrás, e na ocasião o achei muito monótono, extenso demais, e apesar de ter gostado da história, considerei a produção superestimada pelos admiradores de Hitchcock.

Hoje resolvi revê-lo, e a experiência foi outra. O filme cresceu muito no meu conceito, assim como meu respeito e admiração pelo diretor.

Começa pelo fato de Hitchcock ter bom gosto, a ponto de atiçar a curiosidade do expectador logo na abertura estilosa e enigmática, seguida pela perseguição na qual somos introduzidos ao protagonista, e é explicada a origem de sua fobia.

Hitchcock é paciente na apresentação dos personagens, seus dramas, e na construção da premissa de toda a trama. Logo em seguida começa a longa investigação de John, segmento este que talvez seja um dos motivos que afastam quem prefere histórias com um ritmo mais "dinâmico". Foi o que aconteceu comigo na primeira vez que assisti o filme.

Acontece que grande parte do brilhantismo de Hitchcock se evidencia nas perseguições de John a Madeleine. Todo o cuidado com que apresenta os detalhes que ligam a personagem à sua antepassada, dentro do museu. A parte em que ela visita o túmulo de sua bisavó, quando a fotografia fica enevoada, sugerindo a sobreposição da realidade por uma dimensão além-túmulo. E o turbulento instante em que o casal se entrega a seus sentimentos, e se beijam diante de um mar que oscila entre o revolto e o plácido, ilustrando o estado psicológico de ambos.

Em suma, Um Corpo Que Cai não é um suspense para qualquer espectador. Exige muita paciência, e muita capacidade de observação e interpretação para extrair de cada cena o significado incutido pela direção extremamente precisa de Hitchcock, que usa cada técnica a favor da história, desde o conhecido zoom out e track in simulando a vertigem de John, até seu sonho delirante, que através de efeitos especiais econômicos são bastante eficazes em retratar a paisagem mental do personagem no momento em que se encontra.

A trilha sonora de Bernard Herrmann é excelente, e essencial para enriquecer o clima de mistério da trama, mas acredito que o filme não seria prejudicado se ela deixasse de ser tão intrusiva em alguns pontos da história. O tema romântico do casal, por exemplo, torna-se repetitivo e redundante depois de um tempo, especialmente no terço final da história, quando passar a ser usado com muita freqüência.

James Stewart e Kim Novak fazem um bom trabalho, especialmente o primeiro, que retrata bem as mudanças por que o personagem passa depois de um dos pontos de virada da trama. Já a atriz apresenta uma atuação irregular, por vezes é inexpressiva, especialmente na primeira parte da história, algo que acaba por corrigir na metade final do filme.

Em suma, Um Corpo Que Cai é uma de suas maiores realizações de um diretor no auge do domínio de suas técnicas, especialmente por empregá-las a fim de torná-lo passível de múltiplas interpretações e rico em significados. É um filme que merece ser revisitado de tempos em tempos pelo que ele esconde em detalhes que podem passar despercebidos numa primeira sessão.

[CRÍTICA] Festim Diabólico

Direção: Alfred Hitchcock
Roteiro: Hume Cronyn e Arthur Laurents
Elenco: James Stewart (Rupert Cadell), Joan Chandler (Janet Walker), John Dall (Brandon Shaw), Farley Granger (Phillip Morgan), Cedric Hardwicke (Sr. Henry Cantley), Constance Collier (Sra. Anita Atwater), Douglas Dick (Kenneth Lawrence), Edith Evanson (Sra. Wilson), Dick Hogan (David Kentley).
Duração: 80 min.
Ano: 1948

O que impressiona em Festim Diabólico, além do domínio da técnica empregada por Hitchcock, a precisão de seus enquadramentos, e a sincronia com o "momentum" dos atores em cena, é toda a concentração do elenco que, exceto por aqueles pontos da história em que ele se faz necessário, não há sinal de nervosismo diante do desafio que lhes foi proposto pelo diretor.

Todos os atores estão muito bem afiados, e suas interações surgem naturalmente, mas John Dall especialmente se destaca, pela forma como oscila seu temperamento e postura no decorrer da trama. Inicialmente confiante na inteligência e impecabilidade de seu crime, quando se encontra diante da figura de Rupert (James Stewart), que minutos antes ele exaltava como um dos homens mais respeitáveis que conheceu, suas fragilidades são expostas através da gagueira que domina sua fala, do nervosismo de seus gestos. E notem como ele procura se recompor logo que Rupert sai de cena, e ele volta a conversar com os demais convidados, tudo isto num plano sem cortes, que testa os limites do talentoso ator.

James Stewart também brilha em cada aparição de seu personagem, tornando o suspense da história ainda mais enervante, quando constamos sua inteligência e sua capacidade de observação, e a maneira como investiga suas suspeitas, conduzindo meticulosamente seus diálogos, de forma a instigar Brandon e Phillip a uma reação que rompa o véu de inquietação e estranheza que ambos criaram sem intenção.

Apesar de curto, e de ser filmado de forma a passar a impressão de que a história se passa em tempo real, o roteiro é excepcional na tarefa de apresentar seus personagens, suas relações entre si, e com a vítima do crime, e é preciso ao revelar informações sobre o passado de Brandon, Phillip e Vincent, que torna-os mais complexos em suas motivações e decisões do que suspeitávamos no início da trama.

Uma das muitas obras-primas produzidas por Hitchcock, e sem dúvida um dos melhores suspenses de todos os tempos. Verdadeira aula de como equilibrar técnica, talento e roteiro, todos perfeitamente alinhados, numa harmonia que pouco se vê em filmes do gênero, e de qualquer outro.

sábado, 21 de maio de 2011

[CRÍTICA] O Silêncio do Lago


O Silêncio do Lago (Vanishing, Holanda e França)

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Diretor: George Sluizer
Roteiro: Tim Krabbé e George Sluizer
Elenco: Bernard-Pierre Donnadieu (Raymond Lemorne), Gene Bervoets (Rex Hofman), Johanna ter Steege (Saskia Wagter), Gwen Heckhaus (Lieneke)
Ano de lançamento: 1988
Duração: 107 min.

Sinopse: Rex e Saskia, um jovem casal apaixonado, sai de férias. Numa parada em um posto de gasolina Saskia desaparece. Rex passa os próximos três anos tentando encontrá-la, até o dia em que começa a receber cartões postais de alguém que promete revelar o que aconteceu com Saskia.

Crítica:

O que mais chama a atenção em O Silêncio do Lago é sua estrutura narrativa. A história vai e volta no tempo sem rodeios, algumas vezes surpreendendo o espectador ao revelar que determinada cena se passa antes da que acabamos de assistir. Aí reside grande parte da inventividade do longa.

Rex e Saskia surgem como um casal comum, que em questão de minutos se diverte num jogo de adivinhações enquanto viajam, para logo em seguida mergulhar num clima desconfortável quando a gasolina do carro acaba dentro de um túnel escuro, e o rapaz deixa a moça sozinha enquanto parte atrás de combustível. É uma cena importante pela maneira como tal fato afetará Rex mais adiante na história, e por introduzir um elemento simbólico que voltará em diversos momentos do filme: o sonho enigmático de Saskia. Mais sobre ele logo abaixo.

Após fazerem as pazes num posto de gasolina, é a vez de Saskia deixar Rex sozinho para comprar alguns suprimentos para o resto da viagem. Quando o rapaz acha que ela está demorando demais, é inevitável que pensemos que trata-se de uma vingança da garota pelo que seu namorado fez com ela mais cedo. Porém, quando Rex começa a reunir informações sobre os últimos passos de Saskia, os fatos apontam para algo mais aterrador. E esta é apenas a introdução da história.

A grande sacada do roteiro é levar o espectador a acreditar que a trama será totalmente focada nos esforços de Rex para encontrar Saskia, apenas para mudar seu foco para a história de Raymond Lemorne (Bernard-Pierre Donnadieu), o sujeito que a seqüestrou. A partir daí o filme reconstrói toda a cadeia de acontecimentos que o levaram a cometer o crime, e passa a revelar as motivações do personagem, que se torna o grande protagonista do longa.

Raymond guarda semelhanças com o personagem principal do romance Crime e Castigo, de Dostoiévski, encarando o crime como um meio de pôr em prova sua filosofia de vida, mas, ao contrário de Raskólnikov, não permite que a culpa o atormente a ponto de voltar seu plano contra si mesmo, além de ter uma vida social saudável, e uma família que o respeita por ser um pai e um marido exemplar. Bernard-Pierre Donnadieu trabalha com precisão ambos os lados de Raymond, cujo plano é exaustivamente ensaiado, e revelado em detalhes, enquanto procura manter as aparências ao lado da esposa e filhas. É graças ao ator que o filme funciona como um intrigante estudo de personagem, ao mesmo tempo que oferece um suspense envolvente.

Voltando ao sonho de Saskia, a dupla de ovos dourados flutuando num espaço negro ganha várias rimas visuais em diversos pontos da narrativa, como nas cenas noturnas protagonizadas por Rex, onde o brilho amarelado dos faróis de carros remetem diretamente ao túnel escuro onde Saskia se lembra do sonho no início do filme. Uma forma sutil encontrada pelo diretor para ilustrar a culpa que ainda atormenta Rex, além de servir como pistas sobre o destino da garota e a conclusão da história.

Por detalhes como o descrito acima, e a forma como o roteiro trabalha a interação de Rex com Raymond, sem apelar para lugares comuns, aumentando exponencialmente o interesse e a curiosidade do espectador pelo desenrolar dos fatos, O Segredo do Lago é uma aula sobre como fazer um suspense de qualidade sem histrionismo e reviravoltas absurdas.

Nota: 4,5 de 5

[CRÍTICA] O Padrasto


O Padrasto (The Stepfather, Reino Unido e EUA)

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Diretor: Joseph Ruben
Roteiro: Carolyn Lefcourt, Brian Garfield e Donald E. Westlake
Elenco: Terry O'Quinn (Jerry Blake), Jill Schoelen (Stephanie), Shelley Heck (Susan), Charles Lanyer (Dr. Bondurant), Stephen Shellen (Jim Ogilvie)
Ano de lançamento: 1987
Duração: 89 min.

Sinopse: Um homem obcecado por valores familiares chamado Jerry Blake casa-se com mães viúvas e divorciadas. Sempre que sua nova família desvia-se dos padrões que ele julga os mais corretos, Jerry mata mãe e filhos, altera sua aparência, assume uma nova identidade, e muda-se para uma nova cidade, onde recomeça seu ritual. Agora é a vez de Susan, e sua filha adolescente Stephanie, mas a garota logo mostra que não será um alvo fácil.

Crítica:

Com uma boa premissa, e um personagem cuja verdadeira natureza é exposta logo na seqüência de abertura, O Padrasto começa promissor, mas infelizmente mostrasse irregular na execução.

Terry O'Quinn é bem sucedido na composição de Jerry Blake, que de início choca, para logo adiante despertar curiosidade ao surgir como um marido carinhoso e um padrasto atencioso. Seus monólogos no porão da casa são bem trabalhados, oferecendo pistas sobre a origem de sua psicopatia, sem entrar em detalhes.

A história ainda conta com outra personagem interessante, a adolescente Stephanie, vivida por Jill Schoelen, que foge dos padrões da época, brigando com socos e pontapés com uma colega de escola que a ofende (no lugar dos clássicos puxões de cabelo); tomando a iniciativa e flertando sem inibições com um garoto; e conduzindo sua própria investigação para descobrir o segredo de Jerry.

Mas, exceto por Charles Lanyer, que torna seu Dr. Bondurant um personagem simpático, o restante do elenco é regular. Susan (Shelley Heck) é insossa e insuportavelmente submissa, e Jim (Stephen Shellen) tem a subtrama mais inútil e tediosa do longa.

O roteiro ousa ao incluir insinuações de que o Dr. Bondurant tem interesses mais platônicos do que profissionais por Stephanie, além de duas cenas rápidas em que a garota aparece nua durante o banho (apesar de Jill Schoelen ter 24 anos na época, vale lembrar que sua personagem tem 16 anos no filme). Na mesma seqüência Joseph Ruben faz uma "meia-homenagem" ao clássico Psicose, levando o espectador a acreditar que verá uma nova reprodução da cena icônica do filme de Hitchcock, apenas para ir contra as expectativas criadas, um detalhe que particularmente me agradou por fugir do óbvio. Infelizmente o filme surpreende apenas nesta cena, pois em nenhum outro momento a história consegue manter o espectador incerto sobre o que virá a seguir.

Previsível e formulaico do início ao fim, O Padrasto vale mais pela curiosidade de assistir Terry O'Quinn, o John Locke da série Lost, interpretando um personagem bem diferente daquele que viveu em seu trabalho mais conhecido.

Nota: 3 de 5

[CRÍTICA] Possuídos


Possuídos (Bug, EUA e Alemanha)

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Diretor: William Friedkin
Roteiro: Tracy Letts
Elenco: Ashley Judd (Agnes White), Michael Shannon (Peter Evans), Harry Connick Jr. (Jerry Goss), Lynn Collins (R.C.) , Brian F. O'Byrne (Dr. Sweet)
Ano de lançamento: 2006
Duração: 102 min.

Sinopse: Após escapar de Goss, seu ex-marido abusivo, recentemente solto da prisão, Agnes, uma solitária garçonete com um passado trágico, muda-se para um motel barato de beira de estrada. Um dia R.C., sua colega de trabalho lésbica, apresenta-lhe Peter, um sujeito peculiar e um tanto paranóico, com quem Agnes começa a ter um romance. Porém, as coisas não são como parecem, e Agnes está prestes a experimentar um pesadelo claustrofóbico quando insetos começam a surgir...

Crítica:

Possuídos é daquele tipo de suspense que sustenta-se mais pelas sensações que desperta, do que pelas grandes revelações que reserva ao espectador.

É interessante acompanhar a progressão da história, a começar pela forma gradativa com que é construída. Desde o plano aéreo inicial, em que a câmera se aproxima lentamente do motel em que Agnes vive, rodeado por um deserto que mais tarde mostra-se um reflexo do quadro emocional da personagem; até a longa seqüência de abertura, na qual é perturbada diversas vezes por telefonemas em que a pessoa do outro lado da linha não diz nada. William Friedkin, em poucos minutos, estabelece a atmosfera e apresenta o cenário onde grande parte da história se desenrolará.

Confesso que este é o primeiro filme que assisto com Ashley Judd, mas já fiquei impressionado com o seu talento. Sua interpretação é convincente e cheia de nuances. O desleixo de Agnes nas primeiras cenas gera certa antipatia, mas graças à competência da atriz, e ao ótimo roteiro, logo entendemos os motivos que a levaram a adotar aquela postura, e não demora para que nos simpatizemos com ela, e enxerguemos a beleza que se esconde por trás daquela amargura e baixa auto-estima que vemos no início (claro que ajuda o fato da atriz ser bonita, mesmo com as gordurinhas a mais que a personagem exigia, além de ter um sorriso lindo). Toda insegurança e carência afetiva de Agnes, que não hesita em satisfazê-la com pessoas que lhe dão um pouco mais de atenção, como sua amiga R.C. (Lynn Collins), são bem retratadas por Ashley Judd, assim como a instabilidade de seu humor, que ao primeiro sinal de que está sendo magoada não hesita em deixar sua raiva explodir na cara de quem a fez sofrer.

Mas Possuídos não seria um filme tão magnético sem a outra metade de sua força motriz: Michael Shannon. Seu personagem entra timidamente na história, mas aos poucos toma conta dela e a domina com a mesma eficácia com que estabelecesse um vínculo afetivo-paranóico-obsessivo com Agnes. Shannon é hipnótico em cena, com seus maneirismos, seu olhar perturbador e suas neuroses, tornando Peter imprevisível. É especialmente graças a ele que o filme é tão eficiente na construção de seu suspense.

Paranóia é o que comanda todo o longa e o define. O importante não é entender a origem do que acomete o casal, mas tornar seu público tão obcecado pela verdade quanto Agnes e Peter, a ponto de arrastá-lo pela mesma viagem alucinante a que são submetidos, regada a conspirações governamentais e insetos que só eles enxergam, e cuja presença só eles sentem.

William Fredkin pega o espectador pela mão e o leva até o final sem tropeços, tornando-o a cada passo mais envolvido pela situação kafkaniana de seus protagonistas, e o mantém prisioneiro do quarto de motel de onde Peter e Agnes poucas vezes saem. O desejo do diretor de tornar seu público íntimo de seus personagens evidencia-se especialmente na cena de sexo do casal, em que lampejos da nudez dos atores criam um erotismo minimalista muito eficiente nas sensações que desperta. E aqui cabe elogiar a excelente montagem, que dá ao longa um ritmo compassado e quase hipnótico, que aumenta o interesse do espectador pelo desenrolar dos fatos.

Preservando a natureza incômoda dos eventos, e a incerteza quanto à origem deles, o roteiro é hábil ao oferecer algumas possíveis explicações através da lógica distorcida de seus protagonistas, sem confirmá-las totalmente. Ao encerrar a narrativa sem abrir mão de contar a história apenas do ponto de vista do casal, William Friedkin respeita a lógica interna do longa, concluindo-o no exato momento em que Agnes e Peter chegam a uma resolução para seus conflitos. Para o casal, qualquer explicação que não partisse deles seria insatisfatória e não confiável, tamanho o estado de paranóia em que se encontram no ato final (o visual "alienígena" que o quarto do motel adquire é um indicativo de quão distanciados da realidade exterior eles estão). Uma conclusão corajosa para um suspense imprevisível.

Nota: 4 de 5

segunda-feira, 2 de maio de 2011

[CRÍTICA] Rashomon


Rashomon (Rashômon, Japão)

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Direção: Akira Kurosawa
Roteiro: Akira Kurosawa, Kazuo Miyagawa, Ryonosuke Akutagawa, Shinobu Hashimoto
Elenco: Minoru Chiaki (Sacerdote), Takashi Shimura (Lenhador), Kichijiro Ueda (Plebeu), Machiko Kyô (Masako Kanasawa), Toshirô Mifune (Tajômaru), Masayuki Mori (Takehiro Kanasawa), Fumiko Honma (Médium), Daisuke Katô (Policial)
Ano de lançamento: 1950
Duração: 88 min.

Sinopse: O filme descreve um estupro e assassinato através dos relatos amplamente divergentes de quatro testemunhas. A história se desvela em flashbacks conforme quatro personagens recontam os eventos de uma tarde em um bosque, através de um flashback dentro de outro, pois os relatos das testemunhas são recontados por um lenhador (Takashi Shimura) e um sacerdote (Minoru Chiaki) para um grosseiro plebeu (Kichijiro Ueda), enquanto eles esperam por uma tempestade em um portal arruinado. Cada história é mutuamente contraditória, deixando o espectador incapaz de determinar a verdade sobre os eventos.

Crítica:
Considerado a obra-prima de Akira Kurosawa, dono de um dos roteiros mais inovadores do cinema, Rashomon é um dos filmes de maior influência da história da 7ª arte, tendo servido de fonte de inspiração tanto para inúmeras produções cinematográficas, como também para séries de TV e até desenhos animados. Com tantos atributos, falar desta obra de Kurosawa se torna uma tarefa que intimida qualquer cinéfilo que se dedica a escrever sobre sua paixão e tem o mínimo de respeito por ela.

A trama é envolvente do início ao fim, explorando múltiplos pontos de vista, e a verdade por trás do assassinado de um samurai. Nela importa mais desvendar os motivos que levaram cada personagem a contar versões contraditórias de um mesmo fato, do que a verdade em si. É interessante notar que cada narrador opta por uma abordagem que, de uma maneira ou de outra, preserve sua honra, uma das virtudes mais valorizadas pelos japoneses.

Já a direção de Kurosawa exibe um virtuosismo que em nenhum momento é usado gratuitamente. Seus travellings surgem na medida certa, embrenhando-se na floresta em que se passa boa parte da trama, sem que a câmera que acompanha toda a ação do elenco se perca em tomadas confusas. Seus ângulos e enquadramentos são determinados com precisão, compondo um mise en scène harmônico. Além disso, durante as cenas dos depoimentos, Kurosawa opta por jamais mostrar os interrogadores, cujas vozes sequer são ouvidas, evidenciando seu desejo de reservar tal papel a nós, espectadores, que acompanhamos as narrativas conflituosas.

É notória ainda a estrutura engenhosa do roteiro, que se desenrola em três níveis distintos: o primeiro sendo aquele em que o padre, o lenhador e o plebeu conversam debaixo do portal Rashomon; enquanto no segundo temos as seqüências que correspondem às narrativas do lenhador e do padre referentes aos interrogatórios; e no terceiro temos as múltiplas versões do crime da floresta. A maneira com que os três são apresentados e se alternam é elegante o bastante para tornar a trama mais intrigante do que confusa (embora haja uma parcela intencional de confusão).

Confesso que as atuações me incomodaram um pouco por seu overacting, mas, levando em conta que a maioria delas estão inseridas nas narrativas apresentadas pelo lenhador e o padre ao plebeu, não se pode descartar a idéia de que as mesmas refletem a impressão dos narradores sobre aqueles personagens, e não os personagens tais como são na realidade.

Seja como for, 61 anos depois, Rashomon permanece como uma obra que merece todo prestígio e respeito que conquistou. Magnum opus de um dos diretores cuja obra todo amante de cinema deve conhecer.

Nota: 5 de 5

[CRÍTICA] Time - O Amor Contra a Passagem do Tempo


Time - O Amor Contra a Passagem do Tempo (Shi gan, Japão e Coréia do Sul)

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Direção: Ki-duk Kim
Roteiro: Ki-duk Kim
Elenco: Jung-woo Ha (Ji-woo), Hyeon-a Seong (See-hee), Park Ji-Yeon (Seh hee - antes da cirurgia), Sung-min Kim (cirurgião plástico)
Ano de lançamento: 2006
Duração: 97 min.

Sinopse: Seh-Hee (Park Ji-Yeon) e Ji-Woo (Jung-Woo Ha) são namorados de longa data. Eles estão apaixonados, mas Seh-Hee tem uma crise de ciúmes quando seu namorado se sente atraído por outra mulher. Ela está convencida de que Ji-Woo perderá o interesse no relacionamento à medida que o tempo for passando. Para prevenir o rompimento, Seh-Hee decide passar secretamente por uma cirurgia plástica, de modo que ela se torne uma "nova mulher" para o namorado. Certo dia ela desaparece do mapa, deixando Ji-Woo magoado. Com o tempo, porém, ele vai se esquecendo de Seh-Hee, e termina por se apaixonar por uma mulher misteriosa, que guarda um segredo que mudará suas vidas.

Crítica:
Sempre admirei a qualidade plástica dos filmes de Ki-duk Kim, e sua capacidade de dizer muito com poucas palavras, como em Casa Vazia, ou no visualmente arrebatador Primavera, Verão, Outono, Inverno... e Primavera. Porém neste filme achei que pesou-lhe um pouco a mão.
A premissa é criativa, e toca sem rodeios num tema contemporâneo e relevante. Além disto Ki-duk faz bom uso de metáforas visuais que ilustram os anseios dos personagens, sendo a mais evidente delas a praia de esculturas, em sua falsa ilusão de imutabilidade diante da passagem do tempo. Tinha tudo para ser um ótimo thriller psicológico, mas...
A recorrência com que alguns cenários são revisitados no decorrer da história acaba tornando-a redundante a partir de um certo ponto. A impressão que o diretor passa é de que ele queria deixar bem claro o significado de determinados cenários para aqueles personagens, como fica evidente nas inúmeras vezes em que aparece a escultura que ilustra o cartaz do filme.
Além disto as interpretações soam exageradas em diversos momentos, o que acaba comprometendo o efeito dramático de algumas cenas.
Reconheço o talento do diretor, e entendo as intenções que o levaram a dirigir este filme, e o que fez com que tomasse certas escolhas, mas a execução me pareceu um tanto desarticulada. Os personagens são frágeis, pouco desenvolvidos, e não cativam. Assim fica difícil se importar com seus dilemas.
Ainda assim, a história funciona como uma boa crítica à superficialidade de grande parte das relações humanas.
Nota: 3 de 5

[CRÍTICA] Barton Fink - Delírios de Hollywood


Barton Fink - Delírios de Hollywood (Barton Fink, EUA)

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Direção: Joel Coen
Roteiro: Joel Coen e Ethan Coen
Elenco: John Turturro (Barton Fink), John Goodman (Charlie Meadows), July Davis (Audrey Taylor), Michael Lerner (Jack Lipnick), John Mahoney (W. P. Mayhew), Tony Shalholb (Ben Geisler), Steve Buscemi (Chet)
Ano de lançamento: 1991
Duração: 116 min.

Sinopse: Nova York, 1941. Barton Fink (John Turturro) é o dramaturgo do momento e toda a Broadway, além da imprensa, se curva ao seu talento. Como conseqüência Fink vai para Hollywood para escrever um roteiro para um filme B, que aborda a luta livre. Ele se hospeda em Los Angeles no Earle, um hotel de segunda categoria, mas o objetivo de Fink é ficar longe de tudo e todos e se concentrar no seu roteiro. Porém, ele é atingido por um bloqueio de escritor de tal natureza que não consegue escrever nada. Charlie Meadows (John Goodman), seu vizinho, um amigável vendedor de seguros, tenta ajudá-lo, mas diversos acontecimentos bizarros, aliados a um calor infernal, surgem na vida de Barton.

Crítica:
Desde a fotografia primorosa de Roger Deakins, passando pelo visual opressor do hotel onde Fink se hospeda, e o uso inteligente de espaços vazios, e corredores vertiginosos, que ilustram a solidão e desorientação do protagonista num mundo ao qual não está habituado, a direção de Joel Coen funciona magnificamente a favor da história.

Barton Fink é quase um "irmão mais velho" de Adaptação, de Spike Jonze, outro filme excelente sobre um escritor com crise criativa. Neste a abordagem do tema é mais sóbria que naquele roteirizado por Charlie Kaufman, embora tenha sua parcela de delírios, como o subtítulo brasileiro deixa bem claro.
As atuações são muito equilibradas, com destaque para Michael Lerner, como o hilário e verborrágico Jack Lipnick; John Mahoney, que diverte muito em suas poucas partipações como o excêntrico W. P. Mayhew; e John Goodman, que sem muito esforço conquista a simpatia de Barton e do espectador interpretando Charlie Meadows.
Já John Turturro faz um de seus melhores papéis aqui, oscilando com segurança entre as pequenas neuras do personagem e os picos de histerismo, e torna palpável toda a angústia por ele sofrida.
A direção de arte também merece elogios pelo trabalho de recriação de época, e pelo quarto de Fink, que ao longo da história passa a refletir sutilmente o estado interior do personagem, desde os papéis de parede se despregando, até o quadro da moça diante do oceano que ele usa a todo momento buscando recuperar a paz que tanto almeja alcançar consigo mesmo. O design de som também é ótimo, reproduzindo com grande eficácia a tão conhecida sensação de desconforto que sentimos quando um pernilongo vem atrapalhar nosso sono, e os pequenos ruídos que ouvimos à noite quando o "silêncio" impera.
Mais um trabalho de direção exemplar de Joel Coen, que ao lado do irmão prova mais uma vez seu talento em equilibrar comédia e drama, e ainda se permite acrescentar uma dose de suspense que perdura até o último take, que é tanto poético quanto enigmático.
Nota: 4,5 de 5