terça-feira, 20 de setembro de 2011

[CRÍTICA] O Velho e o Mar


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Título original: The Old Man and the Sea
Direção: John Sturges
Roteiro: Peter Viertel
Elenco: Spencer Tracy (O Velho / Narrador), Felipe Pazos (O Garoto)
Ano: 1958
Duração: 86 min.


Não é difícil entender o sucesso e fascínio despertado pelo livro de Ernest Hemingway que deu origem a este filme. Ao mesmo tempo simples e alegórica, a história do velho e infortunado pescador, que um dia se depara com um peixe que exige mais esforço do que o previsto para ser pescado, fala sobre persistência, velhice, o apego à vida e o temor da morte, por meio das reflexões e lembranças do protagonista, enquanto este luta com todas as suas forças para vencer a resistência da criatura que pode ser sua maior conquista.

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Vários pequenos detalhes da direção, atuação e montagem podem passar batidos se levarmos em conta a aparente simplicidade da narrativa, a começar pela entonação de voz do narrador da história. De início ele soa como se a narrasse com má vontade, algo que, confesso, incomodou-me num primeiro momento. Mas, conforme a história se desenrola, entendemos que ele reflete o cansaço e exaustão do velho, cujo esgotamento físico é maior a cada minuto.

Mais importante ainda é atentar para a ligação empática que se forma entre o homem e o peixe, representada pela linha do anzol por meio da qual “se comunicam”. O velho, conforme o embate se estende, passa a considerar o peixe seu amigo, tornando sua desgastante experiência suportável. Com o passar do tempo fica mais claro que o velho começa a enxergar-se no peixe, e identificar-se com sua luta para sobreviver.

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O mar também exerce um papel significativo na história, quando o velho e o peixe estabelecem uma trégua, e ambos descansam de sua luta. Assim as águas que o cercam tornam-se o foco da atenção, convertendo-se num espelho que reflete em si as lembranças do velho, que passa a lembrar-se de uma época em que seu vigor físico era comparável ao do peixe. Quando suas memórias começam a vir à tona, o velho passa em revista toda a sua vida, indo da queda de braço disputada contra um africano (sua juventude), até os filhotes de leão que um dia viu brincando na savana (remetendo à sua infância).

Outro detalhe que merece atenção é a freqüência com que o velho repete a frase “se o garoto estivesse aqui”, que num primeiro momento parece referir-se ao menino que o ajudava nas pescarias, visto no início do filme. Porém, seu significado modifica-se quando levamos em conta a necessidade que o velho sente de reconquistar a quase inesgotável energia de sua infância (e os filhotes de leão aparecem mais de uma vez para reforçar esta idéia), enquanto o pôr-do-sol lhe entristece (símbolo do recolhimento, do fim da vida).

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Mas a alegoria de O Velho e o Mar atinge sua expressão máxima quando o pescador se vê forçado a defender o peixe, já capturado, do ataque de tubarões. O animal passa a representar a vida do velho, enquanto os tubarões personificam o tempo, esta “força” que nada poupa e tudo consome.

Quando o velho pára de lutar, diante da imagem do peixe devorado, é notável sua incapacidade de reestabelecer uma conversa com ele. Antes uma promessa de vida, mesmo àquela altura de sua velhice, o peixe agora é um “meio-peixe”, reflexo de sua alquebrada figura, e lembrete de sua mortalidade.

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“Fomos longe demais”, diz o velho, próximo do fim de sua jornada. Ele não queria a lua, as estrelas ou o sol, apenas um peixe, como dissera mais cedo na trama, apenas um pouco mais de vida, uma última grande conquista antes de entregar os pontos. Se nem tudo saiu como o esperado, ao menos ele lutou o bom combate, recuperou o respeito de seus companheiros de profissão, e reforçou aquele que já ganhara do garoto, que ele aceita de volta como ajudante no final, algo que acaba por representar um rito de passagem tanto para o velho como para o menino. Com isto ganhamos um filme singelo em sua execução, porém rico em significados, uma direção e roteiro que respeitaram a essência da obra original, e uma bela atuação de Spencer Tracy.


Nota 5 de 5

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