quinta-feira, 29 de setembro de 2011

[CRÍTICA] Os Brutos Também Amam


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Título original: Shane
Direção: George Stevens
Roteiro: A. B. Guthrie Jr. e Jack Sher
Elenco: Alan Ladd (Shane), Jean Arthur (Marian Starrett), Van Heflin (Joe Starrett), Brandon De Wilde (Joey Starrett), Jack Palance (Jack Wilson), Ben Johnson (Chris Calloway), Edgar Buchanan (Fred Lewis), Emile Meyer (Rufus Ryker), Elisha Cook Jr. (Frank "Stonewall" Torrey)
Ano: 1953
Duração: 118 min.


Um forasteiro é acolhido por uma comunidade de pessoas oprimidas, por quem afeiçoa-se, e resolve ajudá-las na luta contra um bando de indivíduos que não tem o menor respeito pelos valores familiares, e pelo apego que nutrem por suas terras. Soa familiar pra você? Se é um apreciador de faroestes deveria, porque esta é a premissa básica de um número infindável de produções do gênero, que vão das mais medíocres e esquecíveis, até os grandes clássicos do popular “bang-bang”.


Os Brutos Também Amam faz parte do segundo grupo, pois ao mesmo tempo que conta uma história que possui apelo até hoje, foge de algumas convenções do gênero, como por exemplo ao tratar seus personagens com mais naturalidade, ao invés de apelar para caricaturas e estereótipos pouco desenvolvidos.

Shane (Alan Ladd), por exemplo, é claramente o mocinho desde sua primeira aparição, mas está longe dos heróis do Velho Oeste que fazem questão de posar de durões, e compram qualquer briga que tentam forçá-lo a levar adiante. Durante todo o filme ele raramente saca sua arma, e só atira contra alguém quando não há mais alternativas.


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Outro detalhe que diferencia o filme é o quanto sua trama investe na relação dos personagens, especialmente aquela entre Shane e a família Starrett. Sua entrada naquele círculo familiar, e a simpatia que conquista de cada um dos membros, são conduzidas sem pressa, a fim de que nos ajustemos à situação no mesmo ritmo dos personagens.

Também contribui para que o espectador estabeleça um vínculo com os personagens pequenos episódios em que acompanhamos as famílias de agricultores à cidade, todas felizes e empolgadas com as compras; e a união que há entre elas quando sofrem a perda de um ente querido (o cão chorando e batendo a pata sobre o caixão do falecido dono foi um toque de gênio do diretor).

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O desenrolar da história é lento, o que pode desagradar aqueles que gostam de faroestes cheios de intensos tiroteios, duelos, e empolgantes perseguições à cavalo. Mas aqui o foco é outro. George Stevens busca despertar no espectador o mesmo apreço que aquelas famílias nutrem por seus lares, por aquelas terras férteis, cercadas de belas montanhas, um cenário natural que predomina em quase todas as externas do filme. O diretor ganha muitos pontos por filmá-lo sem o uso de fundos falsos (muito comuns na década de 50), o que aumenta nosso envolvimento com a história e as paisagens, crescendo com isto nossa compreensão do drama daquelas pessoas, sempre sob o risco de perder a paz e prosperidade encontrados naqueles vastos vales, e criando um contraponto com o perigo existente na cidade, uma ameaça constante para as famílias, ponto de encontro de seus inimigos.

Há dois grandes conflitos que movem a trama de Os Brutos Também Amam, um individual e outro coletivo. O primeiro ocorre com Shane, que tenta abandonar seu passado como pistoleiro, e busca uma vida mais pacata, humilde e longe das armas. O segundo é aquele entre a unidade familiar dos agricultores e os rancheiros, unidos mais pelo interesse mútuo de poder, do que por laços afetivos de sangue e amizades. Ao invés de espalhar pela história vários confrontos físicos, o roteiro concentra-os em dois pontos da trama como conseqüência lógica das animosidades que se acumulam ao longo dela.


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A primeira grande seqüência de ação ocorre apenas no meio do filme. Começa com um acerto de contas entre Shane e Calloway (Ben Johnson), que acaba envolvendo outros do bando do adversário, e se intensifica com a intervenção de Joe (Van Heflin). A briga do saloon é uma daquelas situações clássicas do gênero, e nas mãos de George Stevens se transforma numa verdadeira aula de como aumentar o ritmo de uma cena sem pular etapas, e evitar que sua execução soe forçada.

O segundo confronto físico é o exato oposto do primeiro. Longe do caos que domina o quebra-pau no saloon, o tiroteio que encerra a trama privilegia o suspense. Os acordes baixos que aumentam conforme a apreensão cresce, mas sempre em sintonia com a ação; a música que pára no momento de maior tensão; o cachorro que sai com o rabo entre as pernas do saloon, pressentindo o pior; a música que volta quando o tiroteio se inicia; a precisão e a economia dos tiros. Aqui a direção alcança seu melhor momento, em parceria com a eficiente montagem de William Hornbeck e Tom McAdoo.


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Por fim Shane prova que sua nobreza não reside em sua tentativa de mudar o que essencialmente é, mas abraçar sua própria natureza, admitir que seu “molde” não pode ser quebrado, como confessa ao pequeno Joey, e usá-la a favor daqueles que o apoiaram em sua tentativa de vencer a si mesmo.


A luta de Shane acaba sendo contra a era que o criou, e aqueles que impedem a prosperidade dos que retiram sua força dos laços afetivos da família, e recorre às armas como última medida. É o que Shane busca ensinar a Joey, quando saca sua arma apenas no final, e resolve todo o conflito sem desperdiçar uma bala.  Com precisão cirúrgica o pistoleiro remove o “tumor” que ameaçava a saúde daquela comunidade, e marca o fim de uma era, a sua, saindo de cena logo depois, pois o seu momento já passou.


Nota 4 de 5

Um comentário:

  1. Parabéns seu texto como crítica de cinema tem bastante conteúdo, acrescentou bastante a minha experiência. Continue fazendo críticas que ajudem o leitor a compreendeer o filme. Obrigada.

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