quinta-feira, 11 de agosto de 2011

[CRÍTICA] Disque M Para Matar

Direção: Alfred Hitchcock
Roteiro: Frederick Knott
Elenco: Ray Milland (Tony Wendice), Grace Kelly (Margot Mary Wendice), Robert Cummings (Mark Halliday), John Williams (Inspetor Chefe Hubbard)
Duração: 105 min.
Ano:
1954


Em Disque M para Matar, Hitchcock exibe seu domínio pleno do cenário, dos objetos cênicos, e da dinâmica interna dos atores, num trabalho mais racional do que esteticamente belo e rico em simbolismos (embora eles existam). O diretor pouco interfere na narrativa, fugindo sabiamente de estilismos que chamem muita atenção para si, consciente da importância dos detalhes presentes na história, os quais têm papel fundamental em seu desenrolar.



O primeiro grande acerto do filme é a maneira enxuta com que o roteiro de Frederick Knott resolve a apresentação de seus personagens. Em duas breves cenas conhecemos a relação de Tony com Margot, e o caso desta com Mark.


Um expectador mais desatento pode perder a sutileza com que Hitchcock ilustra as relações do triângulo amoroso. Quando Margot está com Tony na primeira cena, sua roupa é rosa, uma cor que conota graça e ternura, longe da paixão representada pelo vermelho do vestido que usa ao encontrar-se com Mark na cena seguinte, num indicativo do estado de seu relacionamento com Tony.
Este jogo envolvendo Margot e as cores prossegue no decorrer do filme, em que vemos a personagem usar roupas cada vez mais escuras, as quais passam a refletir seu estado emocional em face dos eventos, algo que o próprio Hitchcock admitiu fazer intencionalmente.
O roteiro e a direção também acertam ao incluir um longo diálogo entre Tony e Charles, que em pouco mais de 20 minutos introduz a premissa, explica o título do filme, destaca os principais traços da personalidade do protagonista, desperta o interesse do expectador pelo desenrolar da trama, e o deixa fascinado com a inteligência do criminoso, cujo plano é meticulosamente exposto, assim como todo o cenário no qual será executado.
Mas o melhor do filme vem após o crime, quando a história acompanha o conflito entre Tony e o Inspetor Hubbard. É o clássico embate entre um adversário que se julga intelectualmente superior, e confia excessivamente em suas habilidades de contornar imprevistos e amarrar pontas soltas; e outro, que pouco revela de suas capacidades, investindo em seu dom de observar e ouvir, e sendo cauteloso ao analisar os fatos para tirar suas conclusões. Ray Milland e John Williams (não confundir com o famoso compositor de trilhas sonoras) elevam a qualidade dos diálogos com atuações tão precisas quanto as atitudes e posturas que assumem diante dos desafios que um representa para o outro.
E não há como falar sobre “Disque M” sem comentar seu final. A enorme confiança e cuidado empregados por Tony para encobrir seus rastros, que acabam se convertendo na causa de seu fracasso, é um clássico ato falho descrito por Freud.
O erro cometido por Tony ao trocar as chaves seria o indício de uma culpa que ele passa a sentir desde o instante em que chega em casa e vê o estado de Margot após escapar da morte que ele encomendou? Sua postura e seu ar de superioridade seriam débeis tentativas compensatórias, por sentir-se inferior a Mark, um “mero” escritor de suspense, cuja inteligência quase desvenda todo o seu plano? O crime seria sua forma de expôr seus sentimentos, ao mesmo tempo em que oferece um meio de ser punido por sua inferioridade de caráter, e a inveja e ciúmes decorrentes dela?
Quando um filme termina com a deliciosa ironia de que a chave do mistério é, de fato, uma chave, não resta dúvidas de que trata-se de mais um daqueles suspenses que garantiu sua presença eterna na lista dos melhores de todos os tempos.

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